A explícita alegria nas frases lembrava as conversas alheias ouvidas meio sem querer no centro da cidade, e os erros de português as palavras da mãe que se fôra. Chorava e engolia virgulas sem pensar, na mistura da alegria da correspondência com a nostalgia das recordações. No envelope, além da carta, um convite e um retrato antigo de casa – as letras douradas chamavam a atenção, mas não mais que a imagem da família embaixo do cajueiro. Catou no armário um porta-retrato velho, contudo retirou de um dos novos, na escrivaninha, a foto do ladrador, pois a única foto que tinha da família reunida merecia moldura bonita. Guardou o envelope e o manuscrito sob o pano da mesa para ler o convite impresso, formal, com letras enfeitadas, lacrado por um adorno em flor e, já na segunda linha, soube o final: a irmã se casaria em breve.
Correu ao quarto para buscar uma correspondência antiga, na esperança de encontrar o nome do sujeito, mas não encontrou. Já não era aquele namorado esse tal noivo, mas tudo bem, deviam se amar... Pena seria não poder comparecer. De madrugada iria telefonar e dizer coisas bonitas, falar da saudade de tudo por lá e mandar um abraço para o pai. No final, se arranjasse coragem, falaria também pela mãe e diria que ama, mesmo que qualquer “iria se pudesse” soasse quase como um “tentaria se quisesse”. Verdade é que tinha que trabalhar.
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3 comentários:
Porque tudo é mesmo uma questão de prioridade.. e dizer coisas bonitas - tão fáceis como meras palavras - também.
Belo texto, aliás!
Muito bom texto. Singelo, mas com um lirismo profundo. Me fez lembrar Quintana.
Pedro Yuri me mostrou seu blog, curti mesmo.
Se der d� uma passada la do meu (http://atequalquerdia.blogspot.com) ou no nosso (http://dezilusoes.blogspot.com).
Abra�o.
A literatura n�o pode parar.
A angústia.O sofrimento do sorriso ao falar alegremente.Senti.Vi.
Poderosa Narrativa!
Muito Bom!
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